quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Vídeo da semana

David Coulthard vs. Enrique Bernoldi em 2001, no GP de Mônaco.

Na classificação, Coulthard era pole, mas seu carro teve problemas e o escocês não conseguiu ir para a volta de apresentação.

Largando em último, Coulthard logo encontrou a Arrows de Bernoldi e iniciou-se uma das mais hilárias disputas de posição da F1 moderna.

Mais hilária ainda porque o piloto da McLaren tinha um dos melhores carros do grid ao lado da Ferrari de Schumacher e Barrichello.

E disputava ponto a ponto o campeonato contra a Ferrari.

E tomou uma volta de Schumacher.

E outra de Barrichello.

E mesmo assim, Bernoldi se manteve firme e forte.

Depois da corrida, Norbert Haug disse que o brasileiro tinha de ser banido do esporte e Ron Dennis falou na cara de Bernoldi que ele poderia destruir sua carreira na hora que quisesse, pois tinha os meios para isso.



Abaixo, Enrique Bernoldi sobre o ocorrido para o site Grande Prêmio.

GP: É impossível falar de seu primeiro ano da F-1 sem citar as 44 voltas de disputa com David Coulthard no GP de Mônaco de 2001. Hoje, quase sete anos depois, como você avalia aquele episódio? Teria feito algo diferente?

EB: Naquela época, a Arrows era como a Super Aguri de hoje em dia. É difícil você ter alguma visibilidade, principalmente porque naquele tempo somente os seis primeiros marcavam pontos. Por exemplo, se fosse com o regulamento de hoje, eu teria somado pontos naquele ano.

Atualmente, você vê que a diferença do primeiro para o último não é tão grande. Na minha época, era de quase quatro segundos. Com a minha Arrows, era de dois a dois segundos e meio mais lento que a Ferrari do (Michael) Schumacher. Então, não tinha muito que fazer, o negócio era procurar ser mais rápido do que seu companheiro de equipe, o que consegui fazer.

Nas disputas por posições do grid de largada, fiz 11 a 6 no Jos Verstappen, que já corria havia anos na F-1. Estava fazendo bem o meu papel, a equipe gostava do meu trabalho, a Red Bull gostava de mim, todos estavam contentes comigo, mas para o mundo, eu ainda não estava lá. Além disso, o carro quebrava sempre. Aí aconteceu de o David Coulthard aparecer atrás de mim naquele GP, mas aquilo deu visibilidade, porque ele ficou ali durante 44 voltas e a TV ficou em mim aquele tempo todo.

Já estava bem cansado, porque meu carro não tinha volante hidráulico ainda... Era pesado, e tudo. Mas ele chegou atrás de mim e, na verdade, ele não tentou me passar. Sabia que ele estava atrás, mas estava disputando posição, então por que eu deveria deixá-lo passar? Aí ele deu três voltas só colocando o bico do carro... Eu pensei comigo: “Cara, hoje você vai ficar aí atrás. Se você quiser me passar, vai ter que fazer mais que isso, vai ter que chegar do meu lado”. Se ele colocasse do lado, jamais jogaria sujo, mas ele em nenhum momento se colocou em uma posição que pudesse me ultrapassar.

Aí comecei a pegar gosto pela disputa e, ao invés de ser uma corrida monótona, aquilo me incentivou. E essa empolgação passou para a equipe. Senti que os engenheiros começaram a gostar e eles nunca falaram tanto pelo rádio comigo como naquela corrida. E eles diziam: “Vai, vai!”.

Quando o Schumacher começou a se aproximar de nós, eles me diziam os tempos para eu ter noção de onde o Schumacher estava para conseguir deixá-lo passar, mas sem dar chance para o Coulthard, porque certamente ele iria aproveitar a passagem do Schumacher para me ultrapassar, já que ele também era tão rápido quanto o alemão.

Então, isso virou a nossa corrida, porque a McLaren é uma das melhores equipes da F-1, você olha os boxes deles e os motorhomes são lindos, mas eles têm esse ar de superioridade. Vi que aquilo tomou conta de toda a equipe, o cara que segurava a placa nos boxes, vibrava toda a vez que eu cruzava a reta. E se tivesse que fazer tudo de novo, faria exatamente da mesma forma.

Mas o que tiro de válido daquela corrida, o mais importante mesmo, não foi ele ter ficado 44 voltas atrás de mim, mas, sim, o fato de ter guiado sob pressão em Mônaco sem ter cometido um único erro. Não dei nenhuma chance para ele me passar. Eu o dominei o tempo inteiro e isso foi o saldo positivo daquilo tudo.


GP: Como foi enfrentar a fúria de Ron Dennis após a corrida? Ficou alguma mágoa daquele dia? Ou algo que faltou dizer a ele?

EB: Bom, naquela corrida, como eu tinha um tanque menor, sabia que iria parar antes deles. Também sabia que não iria precisar agüentá-lo até a última volta atrás de mim. Pensei: “Quando tiver que ir para os boxes, ele vai permanecer na pista e no momento em que eu voltar, ele não estará mais atrás”. Tanto que na volta em que entrei, ele fez a volta mais rápida da corrida... Quase três segundos mais rápido! Aí, quando voltei, a TV saiu de mim e voltou para os líderes, normal.

Mas essa corrida, para mim, ainda teve uma segunda parte. Quando eu retornei dos boxes, dei umas três voltas e chegou o Raikkonen, com a Sauber, atrás, que também era mais rápido. Então, minha segunda parte da prova também foi sob pressão e já estava bem cansado. Tinha perdido o tubo da bebida na volta de apresentação, meu carro não tinha o volante hidráulico, quer dizer, não via a hora de acabar.

Quando finalizou a prova, meu carro parou sem combustível um pouco antes da entrada do túnel, voltei com o safety-car para os boxes. Mas eu estava tão cansado que não conseguia segurar nem a garrafinha da bebida. Depois da pesagem, quando estava indo para a garagem da equipe, o meu box era um dos últimos e o da McLaren um dos primeiros. E eu fiz de tudo para ninguém perceber que estava passando, mas foi impossível, ainda mais com aquele macacão laranja!

Aí o Ron Dennis veio falar comigo. “O que você acha que estava fazendo hoje aqui?”, ele me perguntou. Eu tinha uns oito anos de idade e lembro que ele era o chefe de equipe do (Ayrton) Senna, então tinha uma outra imagem dele. Além disso, nunca havia falado com ele antes. E se eu fosse falar com ele sobre uma coisa boa, acho já seria estressante, então imagine o que foi aquilo.

Mas eu respondi e disse que estava correndo. E ele: “Ah é? Você acha que segurar um dos líderes do campeonato pela oitava posição é correr de modo esportivo?”. Eu devolvi dizendo que não tinha feito nada de errado e que existiam regras naquele esporte. Se tivesse feito algo de errado, certamente teria sido punido. Ele, não contente, ainda retrucou afirmando que se eu não aprendesse a guiar de forma “correta”, ele poderia “acabar com a minha carreira amanhã”, porque tinha “poder suficiente para isso”. “Se seu carro perdeu a corrida hoje, não foi por minha culpa, mas porque ele ficou parado no grid”, eu disse, e fui embora.

Cheguei na minha equipe, todo mundo estava feliz, comemorando e falei para o Tom o que havia acontecido. Aí ele foi até a McLaren e disse para o Ron Dennis: “Ron, o dia que você pagar os meus pilotos, você pode dizer a eles o que devem fazer, mas enquanto eu pagar, mando eu”.

Na corrida seguinte, no Canadá, eu estava na lista para a entrevista coletiva oficial. Eu, David Coulthard, Michael Schumacher e o Ron Dennis. Aí pensei: “Só me faltava essa”. Quando cheguei na sala de entrevista, o meu microfone estava entre o Coulthard e o Schumacher. O Dennis iria se sentar atrás, mas ele não foi e mandou outra pessoa no lugar. Aí a primeira pergunta, depois daquele bafafá todo, foi para mim. Perguntaram o que eu tinha achado da corrida de Mônaco, principalmente sobre a disputa com o Coulthard.

Quando comecei, bem timidamente, a responder, o Schumacher puxou o meu microfone, ele nunca perdia uma chance de alfinetar os seus adversários, e disse: “A gente tem regras aqui, temos câmeras, fiscais de pista e diretor de prova. O Enrique não fez nada além de correr e lutar pela posição que lhe era de direito. Se eu estivesse no lugar dele, teria feito a mesma coisa. Na verdade, vocês deveriam parabenizá-lo e não criticá-lo por correr”. Acabou aí minha participação na entrevista coletiva.

O Schumacher me defendeu, mas fazendo isso era uma forma de atingir a McLaren, que era sua principal rival naquele ano. Depois disso, o Coulthard ainda veio falar comigo e meio que ensaiou um pedido de desculpas. Mas eu falei na corrida seguinte, se fosse o Senna ou o próprio Schumacher atrás mim, eles teriam conseguido a ultrapassagem em três voltas.

Nenhum comentário: